De Menino e de Dragão

Por Genilse Pimenta
Rhanif trabalhava nas colheitas de trigo, no pastoreio de animais e ajudava alguns pescadores que lhe davam parte de seus pescados. Apesar da pouca idade, Rhanif cuidava da sua família, que contava com a mãe e quatro irmãs mais velhas. A pobreza era recorrente em todo vilarejo onde o menino vivia, entretanto não havia falta de alimento para as pessoas do lugar. Este, de caráter rural, tinha grandes fazendas que pertenciam aos senhores ricos, cujos hábitos não incluíam a generosidade ou a solidariedade.
Mesmo com todas as dificuldades por qual passava, Rhanif sentia-se feliz quando, durante a colheita, o trigal parecia um mar dourado ao pôr-do-sol. Essa felicidade decorria do fato de que ele próprio tornava-se dourado, iluminado. Nesses momentos de devaneio, o menino sonhava e abria seus finos braços como que tentando abarcar toda a grandeza da natureza, todo o esplendor da fertilidade do cereal. Enfim, sonhava e acreditava com toda força de seu coração que era um ser digno das coisas mais maravilhosas do universo.
            Durante uma tarde em que o orvalho caía sobre o trigo e liberava um perfume adocicado, Rhanif sentiu seu corpo flamejar como se tivesse sido atingido por uma língua de fogo. Caiu de joelhos no chão sentindo-se sufocar e, olhando para os lados em busca de socorro, divisou um vulto próximo ao dique de água da fazenda. Com uma das mãos presa à garganta, Rhanif estreitou os olhos para descobrir quem ou o que estava observando-o com tanta intensidade. Porém, faltou-lhe ar aos pulmões e o menino desfaleceu.
            Um forte cheiro de canela misturado a alecrim do campo e o gotejar de água despertaram os sentidos de Rhanif que, imediatamente percebeu não estar só. Tentou pronunciar algo, mas ouviu um sussurro negativo, então respirou fundo e, lentamente abriu seus olhos. Não sabia onde estava, no entanto, tinha uma forte sensação de proteção, como se tivesse voltado para casa.
            Sentado sobre uma cama de folhas, Rhanif olhou ao seu redor e viu um homem à beira da cachoeira. Por alguns instantes, o menino pensou ter se enganado, pois o tal homem, além de completamente imóvel, tinha uma espécie de aura tão brilhante que parecia estar flutuando. Rhanif balançou a cabeça de um lado para outro, pensando que estava alucinando, - talvez por causa do desmaio -, quando aquela figura fixou os olhos nos seus olhos. Seu corpo estremeceu violentamente, então ele soube: seu destino se cumpria!
            Levantou-se e foi em direção ao homem que lhe indicou uma pedra para que se sentasse ao seu lado. Rhanif estava ansioso, queria ouvir o que aquele ser de aparência mágica tinha para lhe dizer. Contudo, distraiu-se alguns momentos para extasiar-se com o balé de milhares de borboletas em torno da cachoeira. Elas estavam por toda parte: nas árvores, no chão, sobre a água; pareciam estar sob um encantamento. Aguçando os ouvidos, Rhanif escutava o farfalhar das grandes asas que lhe soava como música. Não entendia bem o porquê, mas contemplar a natureza fazia parte de sua vida.
            Este último pensamento fez com que voltasse a se preocupar com aquele homem que, sentado ao seu lado, olhava-o com um misto de curiosidade, alegria e preocupação. Então, ele contou à Rhanif a seguinte história:

            Numa noite quente e de lua grande no céu ouviu-se um choro desesperado de mulher que ecoava por toda a plantação de trigo. Essa mulher implorava às divindades que houvesse comida para suas filhas, pois a cada semana morria uma criança de fome no vilarejo. Diante de tantas mortes, ela fez a seguinte proposta: daria a própria alma em troca da salvação das pequenas criaturas.
            Nesse momento, muitas bagas de trigo abriram-se e, magicamente, giraram em torno da mulher. As sementes foram colando-se ao corpo dela e, então, ela sentiu um vento cálido acariciar sua pele, seus cabelos e suas entranhas. Percebendo o que acontecia, ela sorriu para seu amante divino, as lágrimas não impediram de perceber a silhueta de um dragão dourado...
           Depois dessa noite, nenhuma criança morreu de fome neste vilarejo, pois a colheita de trigo tornou-se farta.”
            Rhanif suspirou profundamente emocionado com tal história. Sempre soube que havia algo fantástico naquele trigal dourado. Então fez a pergunta: “O que meu destino traçou para minha história?” O homem tocou-lhe o coração com uma das mãos, aproximou-se de seu rosto e sussurrou-lhe ...

FIM


Comentários

  1. Olá Genilse, muito bom o texto você escreve muito bem achei muito interessante o fato de que você deixa o final do conto para a imaginação do leitor também achei muito interessante o nome do personagem principal Rhanif porque você escolheu este nome? pela sua pronuncia ou talvez ele tem algum significado gostaria que respondesse minha pergunta se puder Obrigado!
    Abss Gabriel

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  2. Adorei o seu conto!! Fiquei com vontade de continuar a leitura! Que tal se ele for o ponto de partida para um livro????

    BETE

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  3. Oi Ge!
    Esse conto nos pega de surpresa em muitos momentos, mas o final é realmente seu ápice.... que gosto de quero mais... Adorei a ideia da Bete!
    Bjs
    Li

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  4. Me chama pra ilustrar o livro ! rsrsrsrs
    Parabéns Gê
    =)

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  5. É isso aí...a vida sempre nos chama para que doemos o que temos de bom, ninguém quer mazelas, por isso, cotidianamente, a gente tem que se desdobrar, perdoar, sem esperar ser perdoado. É lei do natural!

    Louvores pro Cê minha amada. Cê mandô bem.

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